Um estudo realizado na Ufes constata o declínio hídrico em todas as bacias hidrográficas capixabas e aponta a região noroeste do estado como a mais atingida por secas. O objetivo da pesquisa, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Ambiental (PPGEA), foi caracterizar o comportamento de eventos secos e identificar as ocorrências no território ao longo do tempo, entre 2002 e 2020. Para isso, a pesquisadora Julielza Betzel Baldotto utilizou, em seu doutorado, duas ferramentas principais: os satélites do Gravity Recovery and Climate Experiment (Grace) e o modelo hidrológico MGB.
Na foto, o Rio Santa Joana, um dos afluentes do Rio Doce afetados por secas.
Os déficits hídricos nas bacias impactam a atuação agrícola e industrial e o abastecimento público, segundo os pesquisadores. As bacias hidrográficas correspondem a uma porção de território. O relevo dessa área direciona os pequenos cursos d’água, chamados de afluentes, para a área mais baixa da região, alimentando um rio principal e de grande porte, que deságua no mar. O estado capixaba se encontra na Bacia Hidrográfica do Atlântico Sudeste, composta por sub-bacias. O estudo levou em consideração 13 bacias de grande relevância para as terras capixabas, que correspondem aos rios Doce – subdividida em Alto Doce, Médio Doce e Baixo Doce –, Mucuri, Itaúnas, São Mateus, Barra Seca, Riacho, Santa Maria da Vitória, Jucu, Benevente, Itapemirim e Itabapoana.
O conjunto de satélites Grace, lançado em 2002, captou os dados das bacias. O Grace possui sensores que registram as variações de massas de água no campo gravitacional da Terra, revelando uma ampla gama de informações sobre as alterações nos armazenamentos de água. O acesso aos dados, que foram processados pelo Center for Space Research (CSR), da Universidade do Texas, permitiu uma comparação com o método MGB, modelo desenvolvido para aplicações no estudo de grandes bacias, baseando-se em equações físicas conceituais para simular os processos hidrológicos. O MGB foi utilizado para simular as faltas hídricas no período de 1950 a 2019 a partir dos dados de precipitação, temperatura, umidade relativa do ar, velocidade do vento e pressão atmosférica. Foram calculadas, então, as vazões dos rios de uma bacia hidrográfica, a fim de projetar valores de anomalia média mensal de armazenamento de água.
O diagnóstico do Grace apontou que os meses de junho a outubro, anualmente, são os que apresentam níveis hídricos mais baixos – com ênfase em setembro. “Nas bacias da região noroeste do estado, onde existe maior tendência a ter déficits hídricos, destacam-se três eventos secos de longa duração: de 2002 a 2004, de 2014 a 2017 (que foi o mais intenso e longo) e de 2018 a 2020. Além disso, a simulação de dados feita com o MGB também permitiu visualizar essa tendência de déficit hídrico mais acentuada no sentido noroeste”, explica Baldotto.
Impactos futuros
Diante da frequência e do prolongamento dos períodos de seca, o professor e orientador de Baldotto no PPGEA-Ufes, Diogo Buarque, pretende continuar os estudos para buscar compreender como os eventos vão atingir as bacias no futuro. “Nós já temos registros de bacias hidrográficas com redução do seu índice de chuvas devido às mudanças climáticas, como a do Rio Doce, que se localiza no território de Minas Gerais e no Espírito Santo. Avaliamos a parte hídrica da bacia, bem como a parte de sedimentos, e percebemos uma redução no nível de vazão em função das baixas precipitações e do aumento da temperatura, acompanhando as mudanças climáticas”.
Alguns fatores podem contribuir para esse cenário, como as questões climáticas típicas capixabas. “Aqui no ES temos uma época quente e chuvosa (outubro a março) e uma época fria e seca (abril a setembro). Na época fria, é comum termos pouca chuva e escassa oferta de água, com redução das vazões nos rios e da umidade no solo. A região noroeste do estado, normalmente, é a que recebe menos chuva. O problema é que isso tem se intensificado”, detalha o orientador.
O Plano Estadual de Recursos Hídricos do ES de 2018 apresenta valores médios anuais de chuva que variam de aproximadamente 900 a 1.700 milímetros. Em relação à distribuição regional, é possível identificar uma zona úmida a sudeste, com valores médios anuais acima de 1.300 milímetros. O valor decresce em direção ao norte e noroeste, onde se localiza uma zona mais seca, com média abaixo de 1.200 milímetros.
Conheça outras pesquisas realizadas pela Ufes no site da Revista Universidade.
Texto: Ghenis Carlos Silva (bolsista em projeto de Comunicação)
Foto: Agência Estadual de Recursos Hídricos (Agerh/ES)
Edição: Lidia Neves