SBPC na Ufes: Prêmios Nobel de Física e Química de 2024 destacam uso da IA em todas as áreas do conhecimento

21/02/2025 - 17:36  •  Atualizado 21/02/2025 18:08
Texto: Daniela Klebis e Vivian Costa - Jornal da Ciência/SBPC     Edição: Thereza Marinho
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Foto dos palestrantes na mesa principal do evento

A relação entre Inteligência artificial (IA) e os avanços que levaram às recentes premiações do Nobel de Física e Química, em 2024, foi o tema da mesa-redonda Inteligência Artificial e os prêmios Nobel de Física e Química: quem fez o quê?, realizada nessa quinta-feira, 20, durante a Reunião Regional da SBPC no Espírito Santo, sediada no campus de Goiabeiras. Coordenada pelo físico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Ildeu Moreira, a discussão contou com a participação de especialistas que discutiram tanto a trajetória da IA quanto suas aplicações na ciência moderna.

No ano passado, o Prêmio Nobel de Física foi concedido aos cientistas John Hopfield e Geoffrey Hinton pelas suas descobertas no campo do aprendizado de máquina (machine learning), por meio das redes neurais artificiais. Essas inovações possibilitaram a realização de tarefas complexas que imitam o funcionamento do cérebro humano, promovendo avanços significativos na IA. Curiosamente, na mesma edição, o Prêmio Nobel de Química foi atribuído a David Baker, Demis Hassabis e John Jumper, que previram as estruturas das proteínas existentes e criaram novas estruturas químicas de aminoácidos, utilizando de forma ampla a IA.

Entre os participantes da mesa, a professora do Departamento de Informática da Ufes Claudine Badue apresentou uma retrospectiva da história do desenvolvimento da IA. Ela abordou sua evolução desde as primeiras concepções teóricas na década de 1940 até os avanços modernos em redes neurais.

Badue é diretora do Laboratório de Computação de Alto Desempenho (Lcad) da Ufes, apontado como um dos protagonistas brasileiros no desenvolvimento de aplicações práticas de IA na última década. A pesquisadora ressaltou a trajetória de projetos de veículos autônomos no Brasil, como a primeira volta autônoma da Ufes (2014), a viagem entre Vitória e Guarapari (2017), o primeiro taxiamento autônomo de aeronave a jato comercial do mundo (2019), e finalmente a criação do primeiro carro elétrico autônomo do País (2020). “Esses avanços mostram que o Brasil, por meio de parcerias estratégicas, está entre os pioneiros do mundo nesse tipo de tecnologia”, comentou.

Marcos

O professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) César Mattos também fez um breve histórico da IA. Ele destacou a relevância histórica da Conferência de Dartmouth de 1956 que, segundo ele, teve um grande significado ao consolidar a Inteligência Artificial como uma área acadêmica e de pesquisa.

Mattos citou também que a Inteligência Artificial e aprendizagem de máquina não se resumem apenas a redes neurais, pois existem várias outras frentes e métodos. E, entre as décadas de 80 e 90, esses métodos floresceram, surgiram novos algoritmos baseados em árvores, em máquinas de vetor de suporte, entre outros, sendo um período de diversificação.

No entanto, na década de 1990, elas ainda não estavam entregando soluções para os problemas que as pessoas ansiavam, como tradução automática, reconhecimento de fala, visão computacional de maneira mais generalizada. E como não entregou essa expectativa, houve uma nova baixa: um segundo inverno da IA.

Ao mencionar pontos importantes, o professor destacou o ano de 2017, quando pesquisadores da empresa Google publicaram um artigo que definiu uma arquitetura em larga escala para o processamento de sequências longas. “Conhecida como Transformer, ela foi inicialmente utilizada para criar, por exemplo, modelos de linguagem natural, como o processamento de texto, que naturalmente se apresenta em sequência. No entanto, a arquitetura foi rapidamente adaptada para outras estruturas que à primeira vista não parecem sequenciais, como as imagens. A imagem pode ser tratada como uma sequência se for dividida em pedaços, ou patches, que podem ser processados de maneira rápida e eficiente pelas estruturas de Transformers. Atualmente, a maioria das inovações em várias áreas de dados e arte, incluindo processamento de linguagem natural e visão computacional, utiliza alguma variação dos Transformers”.

Ferramenta para a ciência

A professora Carolina Andrade, da Universidade Federal de Goiás (UFG), especialista em Química Medicinal e Medicina Computacional, destacou a revolução promovida pela IA na descoberta de novos fármacos. Segundo Andrade, os recentes Prêmios Nobel de Química e Física refletem a consolidação da IA como ferramenta essencial para a ciência contemporânea. “Os Prêmios Nobel nos fazem refletir sobre a mudança de paradigma que essa terceira onda da IA está provocando. Os laureados de 2024 estabeleceram, desde a década de 1980, as bases para tecnologias como o ChatGPT, que contribuíram para a democratização da IA”, afirmou. “O Nobel de 2024 demonstra que a era da IA chegou para todas as áreas do conhecimento”, disse.

Andrade também enfatizou que modelos de machine learning e deep learning têm sido fundamentais no desenvolvimento de novos fármacos, desde a identificação de compostos promissores até os testes clínicos. No entanto, ela alertou para questões éticas e desafios, como o aumento da desigualdade social, o uso da IA para disseminação de desinformação e seu potencial para produção de armamentos. Para ela, a regulação e o desenvolvimento responsável são essenciais para que os benefícios da IA sejam aproveitados sem comprometer valores fundamentais da sociedade. “É necessário o desenvolvimento seguro e responsável da IA, alinhado aos valores humanos”, concluiu.

Luiz Davidovich, professor titular da UFRJ, por sua vez, falou sobre Física Quântica e também comentou sobre a recente decisão de premiar os cientistas John Hopfield e Geoffrey Hinton com o Nobel de Física de 2024. A escolha gerou uma série de discussões e críticas, porque o prêmio contempla outras áreas.

Davidovich explicou que situações como essa acontecem devido à crescente interdisciplinaridade na ciência. Ele lembrou que, em edições anteriores, houve Prêmio Nobel de Medicina concedido a um químico e a um físico, pela invenção da ressonância magnética.

A atividade está disponível na íntegra no canal da SBPC no Youtube.

Foto: Jardel Rodrigues/SBPC

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