
Os benefícios, os riscos e o futuro da Inteligência Artificial (IA) motivaram uma das conferências mais aguardadas da Reunião Regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), proferida pelo diretor do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (ICMC/USP), André Carlos de Carvalho. O professor expôs um panorama da IA no Brasil e no mundo para o público que compareceu ao Cine Metrópolis nesta sexta-feira, 21. O evento foi apresentado pelo professor emérito da Ufes Alberto Ferreira de Souza.
Intitulada Aprendizagem automática: limites tecnológicos e éticos, a conferência abordou desde os primeiros experimentos com inteligência artificial, nos anos 1950 e 1960, quando a IA “aprendeu” a conversar com pessoas, até o surgimento de veículos autônomos, em 1989, e os modelos mais atuais e sofisticados, como o ChatGPT.
Área que integra as mais diversas disciplinas, explicou o professor, a Aprendizagem de Máquina (AM) investiga algoritmos e técnicas computacionais capazes de aprendizagem automática, utilizando experiências prévias. Nesse contexto, a tecnologia atual abrange as IAs de Propósito Geral (GPAIs), capazes de realizar uma grande variedade de tarefas, a partir de conjuntos de dados diversos, como a geração de textos, imagens e músicas.
“O que chama atenção nela são os grandes modelos de linguagens, como o ChatGPT”, afirma Carvalho. Embora seja uma área caracterizada por grandes avanços recentes e esteja presente no dia a dia, a GPAI ainda não pode ser chamada de ciência, segundo o professor: “Ela ainda está em desenvolvimento. Sabe-se muito pouco sobre como ela funciona e quais são os riscos associados”.
Diferenças
Para ressaltar o avanço da tecnologia, o professor evocou a Lei de Moore, conhecida teoria da área computacional que previa um aumento de duas vezes na capacidade dos computadores pessoais a cada dois anos. No caso das IAs, porém, a capacidade de processamento das máquinas, de 2012 a 2018, aumentou 300 mil vezes.
“Isso tem o lado bom e o lado ruim. O lado bom é que conseguimos fazer mais coisas com essa capacidade. O lado ruim é que as diferenças entre os países aumentaram, pois poucos conseguem produzir máquinas para esses modelos. Ou melhor, poucas empresas conseguem, porque nem as melhores universidades americanas têm recursos para produzir esses modelos”, disse Carvalho.
Além das desigualdades, outros riscos já são vivenciados pela população geral, como a frequência e a sofisticação de golpes financeiros, criação e disseminação de notícias falsas e violações de dados privados. “Mas o risco maior é perder o controle da IA e ela funcionar por conta própria, inclusive projetando outra IA melhor que ela”, afirmou o professor.
Avançando rapidamente, as IAs já tornaram imprevisíveis as projeções a respeito de sua evolução. “As previsões que eram para duas ou três décadas foram batidas em poucos anos. Não dá para prever a velocidade para que a IA chegue na capacidade que se iguale ao raciocínio humano. As cadeias de pensamento estão cada vez mais complexas”, disse.
Brasil
Segundo o professor, o Brasil não é um dos líderes mundiais em Inteligência Artificial, ocupando a 30ª posição no ranking atual. Apenas São Paulo, dos estados brasileiros, está entre os 50 principais centros de desenvolvimento de IA. “Isso é incompatível com o tamanho da população e do PIB”, afirmou Carvalho.
Para tentar desenvolver a área, o governo lançou, no fim de 2024, o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA), que terá um investimento de R$ 23 bilhões até 2028. Embora seja um avanço, segundo o professor, os recursos foram distribuídos de maneira assimétrica, uma vez que apenas R$ 1,15 bilhão foi destinado à difusão, formação e capacitação em IA.
“Formação e capacitação são os meios para o país avançar. O importante é formar gente qualificada. Temos que ter gente tão boa quanto a China, os Estados Unidos e a Europa. Enquanto não tivermos isso, seremos meros usuários da IA”, disse.